sábado, 1 de dezembro de 2007

Direito dos quilombolas está acima ao de propriedade privada

Direito dos quilombolas está acima ao de propriedade privada

Os direitos dos remanescentes de quilombolas ao território é um direito fundamental, que está acima ao de propriedade privada. Essa consideração foi feita pela subprocuradora-geral da República, Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, que participou, nesta sexta-feira (30/11/07), do debate público "Regularização de territórios quilombolas em Minas Gerais", organizado pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Juntamente com outros expositores, ela falou sobre "Os quilombolas: direitos territoriais e legislação".

Deborah Macedo Pereira afirmou que, durante a formação dos estados nacionais e do Estado brasileiro, houve a predominância de uma idéia de que a população era homogênea e tinha um único objetivo. Dessa forma, foram estabelecidos a língua oficial e os símbolos e heróis nacionais, a partir da visão de um único grupo da população, a elite masculina, ficando os outros grupos à margem do direito e da legislação. Segundo ela, a Constituição Federal (CF) de 1988 modificou essa situação e reconheceu a existência do multicultarismo e dos direitos dos vários grupos que compõem a população brasileira.

A procuradora-geral explicou que o artigo 68 dos Atos das Disposições Transitórias da CF concedeu o direito dos quilombolas à propriedade de seus territórios. Para ela, a constituição reconheceu que o território está diretamente ligado à identidade do grupo, sendo fundamental garantir o seu direito às terras historicamente ocupadas. Deborah Macedo Pereira afirmou que foi estabelecido que o direito dos quilombolas é um direito fundamental, que está acima do direito de propriedade. "O direito fundamental é universal, enquanto o direito de propriedade diz respeito a um particular que possua uma propriedade", considerou.

Unidades de conservação - Posição semelhante foi defendia pelo procurador de Justiça e coordenador da Coordenadoria de Conflitos Agrários de Minas Gerais, Afonso Henrique de Miranda Teixeira. Ele considerou que as disposições constituicionais estabeleceram que o direito dos quilombolas a propriedade das terras é atemporal e preexistente. "O Estado tem o dever de emitir os títulos para a população quilombola, que deve prevalecer sobre os bens particulares e também sobre os bens públicos", afirmou.

Afonso Henrique de Miranda criticou a criação de unidades de conservação em territórios dos quilombolas, o que vem impedindo a utilização da terra. Para ele, quando o interesse é da elite dominante, o Estado não tem preocupação em preservar o meio ambiente, como, por exemplo, a utilização da Serra do Curral pelas mineradoras, mas o mesmo não poderia ser dito em relação as populações mais carentes. "A sociedade brasileira tem uma dívida com as comunidades quilombolas que tem que ser paga através da concessão dos títulos de propriedade das terras", destacou. O procurador lembrou ainda que, de acordo com a constituição, os remanescentes dos quilombolas e seus territórios são um patrimônio cultural, que deve ser preservado.

Reintegração de posse - Na abertura do evento, o autor do requerimento para realização do debate e presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Durval Ângelo (PT), disse que a comissão é constantemente solicitada para ajudar na solução de conflitos entre proprietários de terras e quilombolas. De acordo com o deputado, após várias audiências realizadas, foi possível conseguir o compromisso da polícia de que a lei será cumprida e não serão feitas reintegrações de posse sem autorização judiciária. "É importante que esse debate público provoque o Poder Público para agir no sentido de resolver essa questão", destacou. Durval Ângelo lembrou ainda que a Comissão de Direitos Humanos apresentou o Projeto de Lei (PL) 1.839/07, que pretende estabelecer mecanismos capazes de agilizar a regularização das terras dos quilombolas.

Atuação do Estado é ineficaz na regularização das terras

Para o antropólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas, Alfredo Wagner Berno de Almeida, o Estado vem sendo ineficiente no reconhecimento dos direitos dos quilombolas. Segundo ele, pesquisas mostraram que existem 2 milhões de famílias remanescentes dos quilombolas, sendo que os Estados com maior concentração (Minas Gerais, Bahia e Maranhão) são justamente os que o Poder Público praticamente não vem atuando. O deputado Durval Ângelo lembrou que em Minas Gerais existe apenas uma comunidade de quilombolas regularizada pelo Estado, localizada no município de Leme do Prado.

Alfredo Wagner Berno também falou sobre a história dos quilombos no Brasil. De acordo com ele, durante o período colonial, era considerado como quilombos um grupo de negros fugitivo. Ele lembrou que, após a abolição da escravatura, em 1888, não houve, como nos Estados Unidos, uma preocupação em conceder terras para os negros. "Pelo contrário, aqui a elite dominante ficou preocupada se era necessário conceder indenização aos proprietários de escravos", destacou. Segundo o antropólogo, durante os 100 anos que separaram a abolição da Constituição de 1988, os quilombolas deixaram de existir juridicamente, ficando as comunidades sem direitos jurídicos e sem identidade. Para ele, é preciso reconhecer que a sociedade atual ainda é escravista e que muitas vezes os policiais que retiram os quilombolas das terras atuam como se fossem capitães do mato.

Assistência jurídica - O juiz da Vara de Conflitos Agrários de Minas Gerais, Osvaldo Oliveira Araújo Firmo, afirmou que é importante que as comunidades de quilombolas e os movimentos sociais contem com uma assistência jurídica. "A presença desses técnicos poderá garantir maior tranqüilidade aos movimentos e evitar que se criem certas expectativas", considerou.

Para Osvaldo Oliveira Araújo Firmo, é importante que os movimentos sociais lembrem que atualmente no Estado brasileiro não são só os seus direitos que estão sendo desrespeitados. "Por exemplo, o direito de todos a saúde constantemente não é cumprido", disse. De acordo com o juiz, é importante que os movimentos sociais lembrem que a função social das terras não pode ser deixada de lado. "A função social da terra que é estabelecida pela constituição tem que ser aplicada para os grandes e pequenos proprietários", considerou.

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Fonte: http://www.almg.gov.br/Not/BancoDeNoticias/Not_669535.asp

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