quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Entre Obama e Hillary, a crise geracional do Partido Democrata

Um grande texto sobre a realidade dos Democratas nessa eleição. Do jornalista Pedro Dória:

Entre Obama e Hillary, a crise
geracional do Partido Democrata


Esta é uma semana de psicanálise, aqui nos Estados Unidos, para o Partido Democrata. Na tevê, uma jovem militante pró-Hillary Clinton, Debra Bartoshevich, está fazendo campanha para John McCain. ‘Sou democrata’, ela diz, ‘apoiava Hillary, agora votarei em John McCain.’ Aí, completa: ‘Você também pode fazer isso.’


Ela era delegada eleita nas primárias – tinha voto na convenção desta semana. Foi cassada. É feminista. Quando lhe perguntaram como poderia votar em alguém que pretende colocar na Suprema Corte juízes que derrubem a legalidade do aborto, Debra respondeu que não acreditava que McCain viesse a fazer isso.

Mas esta é a plataforma de McCain. Como era a de George W. Bush antes dele. E como juízes o suficiente mudarão nos próximos anos, McCain é capaz de conseguir. Certamente tentará.

A decisão de Debra Bartoshevich é irracional – e tanto líderes democratas quanto republicanos sabem disso. Há um bocado de irracionalidade no processo político norte-americano – e só a psicanálise explica. Barack Obama tem de lutar contra a idéia de que ele é elitista, enquanto McCain não seria.

McCain é neto e filho de almirante. Estava ele próprio para ser elevado a almirante quando partiu para a carreira política. Virou senador. É um herói de guerra – que não restem dúvidas. Obama é neto de avós da classe média baixa dos EUA por um lado e de humildes fazendeiros quenianos, do outro. Seu pai o abandonou, a mãe o criou com um salário de professora. Filho de mãe sozinha que se virou como deu. Pelo brilho conquistou as bolsas que lhe financiaram uma educação em universidade de ponta.

Não é que seja um defeito pertencer à elite. É só que, dada a história pessoal de cada candidato, é irreal que alguém considere Obama elitista e McCain, não.

Mas muito de política tem a ver com a percepção, as ilusões, as expectativas – psicanálise.

Ontem, quando Michelle Obama falou à convenção, ela tinha duas missões. A primeira, contando sua história, a de reforçar a idéia de que a família vem da classe média e que nada, em suas vidas, veio fácil. A segunda era seduzir as mulheres frustradas pela derrota de Hillary.

Os aplausos que recebeu foram mornos.

As feridas entre Bill e Hillary Clinton e Barack Obama estão abertas. Em parte, é amargura pela derrota. Em parte, é o lidar com a idade. O Bill Clinton que chegou à Casa Branca em 1992 era o primeiro da geração Baby Boom na presidência. Aquele foi um marco. Dwight Eisenhower, John Kennedy, Lyndon Johnson, Richard Nixon, Gerald Ford, Jimmy Carter, Ronald Reagan e George H. W. Bush – todos tiveram idade suficiente para lutar na Segunda Guerra. Com as exceções de Johnson e Reagan, todos os presidentes pós-Segunda Guerra lutaram no conflito. Clinton foi um sopro repentino de juventude, uma brusca mudança de geração no comando. Um símbolo de fim da Guerra Fria. E ele era informal, visto vez por outra de bermuda, camiseta e boné, um sedutor.

Só que isso é história. Clinton, o atual Bush e McCain são da geração que tinha idade o suficiente para lutar no Vietnã. (McCain saiu de lá herói; Clinton se recusou a lutar; Bush escapou com o pistolão do pai. Obama era uma criança.) Os Clinton já cruzaram a faixa dos 60 anos.

É a população norte-americana que decidirá se é hora de mudar a guarda ou não. Se Clinton – o ex-presidente – tem motivos psicanalíticos para sua amargura, também é verdade que Obama não fez de nada para facilitar o processo de aproximação. Se falam formalmente, com gentileza e frieza. Não passa disso. Obama não se esforçou para ajudar com as dívidas da campanha de Hillary, não faz elogios públicos. O amor e carinho que Obama demonstra para com Ted Kennedy, o patriarca dos democratas no Senado, está longe da relação que mantém com Clinton.

Há uma disputa geracional dentro do partido e entre a população. Os líderes da velha guarda, Kennedy e Carter, se entregam apaixonados à mudança. Os líderes que estão sendo substituídos agora não gostam. Mais que compreensível. E essa briga é refletida no comportamento dos eleitores.

Esta é a história dessa semana. Lá fora, no eleitorado geral, há um problema de classe e outro de raça. Mas internamente, no Partido Democrata, o que pesa mais é geração. A geração do Baby Boom que fez a política revolucionária dos anos 60 se ressente da alternância. A cada dia, na convenção, essa mistura de ressentimento pela passagem do tempo e intransigência juvenil, uma briga de família em que as coisas jamais são ditas, vai sendo sublinhada. Os avós abraçam os netos enquanto pais e filhos se desentendem.

Não há nada de racional no processo. Não houvera a briga, Obama tinha a eleição garantida. Mas a briga está lá. E, na televisão, seu maior reflexo: Debra Bartoshevich, abraçada a um ideal feminista de outrora, jura que McCain nada fará para combater o aborto legal. Não importa quantas vezes McCain diga o contrário. Ele sabe. Hillary e Bill sabem. Obama também sabe.

Quantas Debras não existirão por aí? Essa é a questão.

Prezados leitores: de Palo Alto, na Califórnia, o Weblog está de volta.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Retornos

A melhor coisa de um Blog é o retorno e principalmente quando este retorno vem dos próprios atores. Já recebi um comentário do Hyldon a respeito de um post que comentava sobre sua obra musical. E agora acabo de receber do Poeta Luis Carlos, o seguinte comentário a respeito do Post "Poesia para toda parte" dedicada a ele:

Escrevo por cima das letras acima...feita de minhas letras em punho...publicar significa dar ao público. Bom uso!

Luís Carlos de Oliveira Aseokaýnha

domingo, 24 de agosto de 2008

23 de agosto - Dia Internacional da Memória do Tráfico Negreiro

23 de agosto - Dia Internacional da Memória do Tráfico Negreiro

Para não esquecer jamais!!!

A data foi decretada pela Unesco em 1999.

Foi escolhida por ser a data da revolta de São Domingo, por Dessaline e Toussaint Louverture em 1791. Comemora a insurreição que houve na ilha de São Domingo, hoje Haiti e República Dominicana, na noite de 22 para 23 de agosto de 1791. A revolta abalou o sistema escravocrata e deu nascimento ao processo da abolição do tráfico negreiro translatlântico.

Representa a data da primeira república negra que foi liberada pelos próprios negros em luta contra os franceses.

mais em:
http://portal. unesco.org/ culture/es/ ev.php-URL_ ID=5420&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION= 201.html


Quem confia em Aécio Neves?

Quem confia em Aécio Neves?

Não há qualquer diferença entre as prioridades do "construtor de pontes" e o ideário neoliberal da cúpula tucana. As reformas estruturais mais importantes - agrária, habitação, educação e a do saneamento básico- não têm lugar na sua agenda. Como não teve nas de FHC, Serra e Alckmin.

Gilson Caroni Filho

O governador de Minas Gerais, Aécio Neves, gosta de aparecer na grande imprensa como o "tucano diferente". Um oposicionista que caminha na contramão da política pequena de seus companheiros de partido, apresentando- se como um homem público preocupado com o desequilíbrio federativo, originado pelo que chama de "hegemonia paulista na política". Sua originalidade residiria no fato de ser um oposicionista com propostas para o país, ave rara no bloco conservador. Nada mais enganoso. Nada mais perigoso.

Suas críticas mais recentes ao governo do presidente Lula desmontam os elementos discursivos empregados na tentativa de produzir sua significação, de elaborar uma persona que o defina como "construtor de pontes" entre partes que, segundo ele, estão "cegas por radicalizados projetos de poder".

Segundo o jornalista Ricardo Noblat, o governador lamenta que Lula desperdice o seu segundo mandato não promovendo reformas na Previdência Social, na área tributária e nas relações trabalhistas. Todas elas, segundo Aécio, "indispensáveis para a fundação de um Estado moderno, ficarão para ser feitas pelo sucessor de Lula. Que ainda será obrigado a enxugar despesas governamentais que não param de crescer".

Como se vê, não há qualquer diferença entre as prioridades do "construtor de pontes" e o ideário neoliberal da cúpula tucana. As reformas estruturais mais importantes - agrária, habitação, educação e a do saneamento básico-não têm lugar na sua agenda. Como não teve nas de FHC, Serra e Alckmin.

A reforma da Previdência é uma bandeira cara ao neoliberalismo. Com o "nobre" propósito de combater um falso déficit, o objetivo é a supressão de direitos, principalmente de mulheres e beneficiários do salário mínimo. Aécio finge ignorar que as receitas superam as despesas, mesmo após três anos seguidos de aumentos reais do mínimo.

Simula desconhecer que o presidente já afirmou que a reforma será pautada pelo Fórum de Negociação da Previdência, como proposta amadurecida na sociedade civil, "permitindo que as novas gerações tenham um sistema mais condizente com as necessidades dos trabalhadores". Um foco bem diferente do que reza o receituário mercantil.

Não sabe também que, em fevereiro, o governo encaminhou projeto de reforma tributária que pretende desonerar empresas, gerar mais empregos e acabar com a guerra fiscal entre os Estados. Em que nuvem anda o jovem Aécio? Ou em que praia do litoral fluminense tem surfado o neto de Tancredo?

Para o "construtor de pontes", o PAC ( Programa de Aceleração do Crescimento) não passa de uma jogada marqueteira."Rode por Minas. Tente encontrar alguma obra de vulto financiada pelo PAC. Não encontrará", aconselha.

Pena que tenha esquecido de dizer que o Estado que governa tem 114 das 119 prefeituras envolvidas em desvios de verbas do programa. E que o PSDB detém o maior número de prefeitos sob suspeita de fazer parte do esquema de apropriação ilegal dos recursos. Alguém precisa lembrar ao governador que obras de vulto não brotam do chão, ainda mais se no subsolo há dutos duvidosos. E que, como liderança estadual, cabe a ele alertar seus correligionários quanto a esse pequeno deslize ético.

Em visita ao Rio, na manhã de um ensolarado 15 de agosto, Aécio atacou supostas falhas do governo na segurança pública, argumentando que "o governo federal não assumiu a sua responsabilidade na questão da segurança pública, contingenciando recursos do Fundo Penitenciário e do Fundo Nacional de Segurança". É uma pena que a censura da imprensa mineira, praticada em proveito do seu próprio governo, deixe o fenômeno de Minas tão desinformado.

Uma breve leitura do jornal Brasil de Fato, em 14 de maio de 2007, faria com que tomasse ciência de que na sua gestão ", os investimentos em saúde, segurança pública e educação caíram, de R$ 11,6 bilhões para R$ 8,7 bilhões, impactando a vida de milhares de pessoas na capital e no interior do estado."

Há algum tempo, a vereadora petista Neila Batista, em artigo intitulado "MG: Quase um Estado de exceção" afirmou que "o silêncio da Assembléia Legislativa de Minas, com exceção das poucas vozes do PT e do PC do B, e o pacto da maior parte imprensa regional, que se engajou em sua carreira rumo à Presidência da República confirmam a regra... ou a exceção"

Fragilizando instituições caras ao jogo democrático, ignorando a importância do sistema partidário e "fazendo uso de uma máquina de marketing inigualável no país", a "novidade" que vem das alterosas é a melhor expressão do mandonismo risonho que segue à risca os preceitos neoliberais.

Seria interessante que Aécio aproveitasse a segunda metade do mandato para redemocratizar o Estado, dialogar com os movimentos sociais e, se der tempo, conhecer Minas Gerais. É uma das unidades federativas mais ricas do país. Bem mais surpreendente que as noites do Leblon.


Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Observatório da Imprens

terça-feira, 19 de agosto de 2008

O afro Dorival Caymmi italiano

Do Blog irmão Atabaque

O afro Dorival Caymmi italiano

Capa do disco de 1957: a caricatura de Caymmi destaca seus traços negros


Dorival Caymmi (1914-2008) é uma esfinge brasileira.
Sua descendência afro materna é ocultada em favor de sua descendência italiana.



Caymmi como Machado de Assis passou por um processo de branqueamento de sua imagem como parte do jogo perverso que a democracia racial brasileira empreende contra o simbólico negro procurando esvaziá-lo de seus contextos em favor de uma idéia de mestiçagem que significa um não-negro em favor de um quase-branco.

Caetano Veloso, agora ressignificado depois de integrar o contente grupo dos "113 intelecutais anti-cotas" declarou que Caymmi foi o "gênio da raça".


Certamente ele evocava o talento ímpar de Caymmi no gênero humano, mas não deixa de ser ilustrativo da guerra simbólica que uma certa tradição intelectual brasileira elabora e atualiza sob seus termos a idéia de democracia racial onde a existência da identidade negra tem como limite seus valores euro centrados.

O legado de Caymmi para a cultura brasileira será possivelmente ainda maior se de sua figura não ocultarem de suas melenas brancas seu ondulado crespo e de seu longevo sorriso alvo seus carnaudos lábios negros.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Perrelas em apuros

Parece que eu não bradava sozinho. Loas ao Ministério Público.
Deu no Blog do Juca Kfouri.

Perrelas em apuros

Da assessoria do STJ

O ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), indeferiu o pedido de liminar em habeas-corpus e manteve a decisão do Tribunal Regional da 1ª Região (TRF1) de quebrar o sigilo bancário e fiscal dos dirigentes do Cruzeiro Esporte Clube. O presidente da entidade, Alvimar de Oliveira Costa, e o vice-presidente de futebol e também deputado estadual de Minas Gerais, José Perrella de Oliveira Costa, são acusados de enriquecimento ilícito com a venda dos direitos econômicos de jogadores.

Os dirigentes alegaram ao STJ que faltava fundamentação na decisão de quebra de sigilo expedida pelo TRF1 e pediram ao relator, ministro Og Fernandes, liminar para lacrar qualquer documento referente a eles até que a Sexta Turma do STJ julgue o mérito do habeas-corpus. No mérito, os dirigentes pedem a anulação da decisão proferida pelo TRF1.

O Ministério Público de Minas Gerais abriu procedimento administrativo contra os dirigentes em 2003. Na denúncia, há relatos de que eles se beneficiaram de contratos realizados com as empresas Hicks, Muse, Tate & Furst Incorporated (HMTF), que criaram a Cruzeiro Sports Licensing CO, além do contrato com a EMS Sigma Pharma, que viabilizou a contratação e venda de jogadores.

O ministro Og ressaltou que a decisão do TRF1 se fundou em suspeitas levantadas no próprio processo e a concessão de liminar exigiria a análise pormenorizada de provas, tarefa impossível num pedido de liminar em habeas-corpus. A questão de mérito ainda deve ser apreciada pela Sexta Turma.

O blog acrescenta que inúmeros cartórios mineiros estão sendo solicitados para mandar o que têm registrado em nome dos irmãos, que se dão muito melhor com o Cruzeiro do que o Cruzeiro se dá com eles.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

É hora de rever a Lei da Anistia

É hora de rever a Lei da Anistia

Pedro Dória

10/August/2008 · 14:07 ·

Levantado há quase duas semanas pelo ministro da Justiça Tarso Genro, esse não é um debate novo no Brasil. Também não é um debate no qual dê muita vontade de entrar. Na semana passada, passei duas horas conversando com a professora Flávia Piovesan da PUC-SP, uma das maiores autoridades no país em Direito internacional, com ênfase em direitos humanos. A conversa foi publicada, hoje, no caderno Aliás do Estadão. Quando estiver online, publico o link. Tive uma aula.

A questão fundamental, aqui, é tortura. O Chile também anistiou seus ditadores. Como fez a Argentina e tantos outros de nossos vizinhos. E todos reviram a anistia. O Brasil é único na recusa de sequer discutir o assunto. Por que nosso vizinhos reviram a anistia?

Porque tortura não é um crime anistiável.

Quando o Estado, detentor do monopólio do uso da força, tortura sistematicamente pessoas que estão sob sua guarda, comete um crime contra a humanidade classificado junto ao genocídio, à limpeza étnica, à esterilização forçada de mulheres. Não é matéria de opinião. A classificação é jurídica. E crimes contra a humanidade têm uma característica muito específica: nenhum país tem o poder legal de perdoá-los.

O Brasil é signatário da Convenção Interamericana de Direitos Humanos e da Convenção Contra a Tortura da ONU. O resultado prático é que quando qualquer um é torturado no porão de uma delegacia brasileira, seja hoje, seja no tempo da Ditadura, qualquer juiz de qualquer país signatário das convenções pode processar este cidadão brasileiro. Na verdade, se tiver as provas (mesmo que testemunhais) nas mãos, tem a obrigação de processar. Quando um crime contra a humanidade é praticado, todos somos vítimas. É por isto que 13 militares brasileiros são réus em um processo movido em Roma.

Processos assim começarão a aparecer, lá fora e aqui dentro. Há três processos na Justiça brasileira neste momento.

Um é movido pela família Teles, e pede que o Estado reconheça a culpa por torturas às mais bárbaras cometidas contra Amelinha Telles, sua irmã (que estava grávida), e os maridos respectivos. Algumas das sessões de tortura aconteceram na frente dos filhos crianças. Não pede a condenação do coronel Brilhante Ustra, que chefiava o DOI-CODI de São Paulo, mas pede que ele seja apontado como responsável em tribunal.

Outro caso, o mais recente, é do Ministério Público Federal de São Paulo, que lista os casos de vítimas de tortura indenizados pelo governo brasileiro no mesmo DOI-CODI de São Paulo e pede ao coronel Ustra e seu sucessor no comando da instituição que façam o ressarcimento dos cofres públicos pelo prejuízo causado.

Ambos os processos tentam driblar a leitura corrente da Lei de Anistia, jamais testada no Supremo Tribunal Federal, de que a anistia serviu também para a tortura. Não pedem a condenação pelos crimes. A lei diz que estão perdoados os crimes políticos e aqueles ‘conexos’, ou seja, relacionados. Do ponto de vista legal, tortura não é crime político; é crime contra a humanidade.

O terceiro processo quer responsabilizar o Estado brasileiro por não ter investigado o que houve com os guerrilheiros no Araguaia. Este não circula apenas na Justiça do Brasil, ele também foi aceito e está sendo analisado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ligada à OEA.

E aí está o pulo do gato: a decisão de se a anistia vale para a tortura não depende apenas do que dizem Executivo, Legislativo e Judiciário brasileiros. Após o STF, existe a Comissão e, acima dela, como última instância, a Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Lei de Anistia do Peru foi anulada por esta corte.

Do ponto de vista legal, o governo do Brasil pode receber a ordem da Corte Interamericana de anular sua anistia e ignorá-la. Chile, Argentina, Peru, todos nossos vizinhos, têm histórico de acatar as decisões da Corte. Se não o fizer, neste tempo em que até a atrasada África começa a entregar seus ditadores para a Justiça internacional, o Brasil fica mal.

O torturador, cumpre lembrar, não é apenas aquele sargento sádico e desumano nos porões. O torturador segue uma cadeia de comando, que ativa ou passivamente, permitiu a tortura. A Justiça deve chegar aos generais que comprovadamente estavam informados e nada fizeram para evitar.

À direita, cobra-se apenas que seja coerente. Nos EUA, um de seus direitos mais caros é a Segunda Emenda à Constituição. Ela determina que todo homem tem o direito de ter uma arma em casa e resistir à tirania do Estado. Se o Golpe de 1964 veio com o objetivo de organizar o Brasil caótico de João Goulart, não importa. Se havia risco ou não de um Golpe comunista, também é irrelevante. A tirania que existiu foi aquela imposta pelas Forças Armadas Brasileiras que renegaram a Constituição, quebraram a hierarquia pondo-se contra seu comandante em chefe, o presidente eleito da República, suspenderam direitos de todos os cidadãos e seqüestraram o poder por 21 anos.

Qualquer cidadão tinha o direito de pegar em armas se o quisesse para resistir à tirania. Este, sim, é um crime anistiável. Em países como os EUA, sequer é crime. É direito constitucional.

Os torturadores do Brasil enfrentarão a Justiça cedo ou tarde. A única dúvida é se haverá tempo para que a Justiça seja feita com alguns deles vivos.

Previsível 'Jornal Nacional'

Do Blog do Juca, o único que coloca o dedo na ferida do esporte nacional.

Os Jogos da hipocrisia

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Não é de hoje que o Movimento Olímpico perdeu seu idealismo. Mas Pequim passa de todos os limites
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"POR QUE você não foi para Pequim?", perguntam.

"Porque não quis", respondo. Mais: estou entrando em férias e só volto aqui no dia 21. (Nota do blog: o "aqui" se refere apenas ao jornal...).

Claro que verei a Olimpíada e até comentarei no blog, mas ando cheio de tanta hipocrisia, a começar pela caça aos que são pegos no antidoping por hábitos que só fazem mal e pioram o rendimento.

Não aceito ver essa cartolagem imunda da família olímpica no papel de fiscal dos hábitos da juventude e, ainda por cima, expondo jovens à execração pública, como acabam de fazer com um jogador do handebol brasileiro.

Como não suporto o ufanismo da maior parte das narrações, com as exceções de praxe para os felizardos que podem assinar um canal de televisão fechada, razão pela qual darei uma fugidinha do país para acompanhar Pequim de uma cidadezinha colonial mexicana apaixonante chamada Guanajuato.

Porque passa do limite ver um Carlos Nuzman fazer quase o elogio da poluição ou se jactar pela maior delegação brasileira da história, quando só 12% de nossa rede escolar tem quadras de esporte.
Aliás, quanto mais medalhas o Brasil ganhar, mais ficará demonstrado o desvio de sua não-política esportiva, porque privilegia o alto rendimento em vez da inclusão social ou a saúde pública por meio da prática de esportes.

Dá engulhos ver a cartolagem em hotéis de até sete estrelas enchendo a boca para dizer que esporte e política não se misturam, quando nada foi mais político do que escolher Pequim para receber os Jogos, cidade que, além de poluída, é uma capital que se notabiliza por cercear direitos básicos da cidadania.

Tudo por dinheiro, tão simples assim.

Porque a China talvez seja o melhor exemplo, com todas as suas contradições, de como ainda não se achou um sistema razoável, tão óbvias são as mazelas do comunismo e do capitalismo reais.

É claro que verei tudo, é claro que me emocionarei com as vitórias brasileiras, como com a festa de abertura.

É evidente que torcerei para que aconteçam triunfos como nunca, porque tenho a surpreendente capacidade (surpreende a mim mesmo, diga-se) de voltar a ser criança a cada competição em seu apito inicial.

E não é de hoje.

Faço assim com os jogos de futebol lá se vão bem uns 26 anos, depois que se revelou a existência da chamada "Máfia da Loteria Esportiva".

Porque paixão é paixão e não se explica, não se racionaliza, se sente.

E se curte.

Sim, eu sei que serei capaz de me comover às lágrimas até com a superação de um atleta que não seja conterrâneo, como já me aconteceu inúmeras vezes.

Mas é preciso que se diga que mais que em Atlanta, quando os Jogos Olímpicos modernos comemoraram cem anos e a Coca-Cola alijou Atenas de recebê-los num crime contra a história, esta edição chinesa é um soco em quem associa o esporte à saúde e à liberdade.

Lamento sentir assim, mas quem viveu a inesquecível festa de Barcelona-1992, cujos equipamentos até hoje são utilizados por quem os pagou, os catalães, além da hospitalidade que recebeu o mundo tão bem, não pode engolir Pequim-2008.


Previsível 'Jornal Nacional'

De volta ao hotel, em Guanajuato, para ver o "Jornal Nacional", imaginei o que veria.

A exaltação da vitória do futebol masculino sobre os chineses, as "primeiras imagens" do filho de Marcelinho, que choraria, o oitavo lugar da ginástica feminina que "vale como ouro" e algum outro atleta brasileiro que, derrotado, cairia em prantos.

Sim, porque "a maior delegação brasileira da história", tirante os esportes em que tradicionalmente os atletas nacionais se dão bem, até agora, apenas participa, como era de se esperar.

Os decantados resultados do Pan-2007 não se repetem, porque a realidade teima em brigar com o ufanismo.

E as desculpas se sucedem, uma atrás da outra. E nem seria preciso.

Claro que estar entre as oito finalistas na ginástica não é pouca coisa.

Mas é obviamente frustrante verificar que a diferença para a Olimpíada passada foi de ir do nono ao oitavo lugar.

Nesse ritmo...

Ganhar de 3 a 0 da desfalcada China no futebol, então, é digno apenas de um rodapé. E ponto.

Para o futebol, Pequim começa agora, contra Camarões.

Eduardo Santos, o judoca, que ficou por pouco na luta pelo bronze, chorou o velho choro dos atletas brasileiros que lutam contra tudo e todos, porque o dinheiro, cada vez maior, patrocina muito mais mordomias dos cartolas que apoio aos atletas.

Mas isso você quase não vê no jornal.

Vida que segue, como diria João Saldanha, que tinha o hábito pouco brasileiro de falar das coisas como as coisas são.

No "Jornal Nacional", inclusive.

Ou, no caso dele, como as coisas eram.

Embora, no nosso caso, ainda sejam.

Melhor saber que o "JN" é finalista de um grande prëmio de mídia pela bela cobertura que fez do acidente da TAM, pouco mais de um ano atrás.

Catástrofe que consegue ser incomparavelmente maior que a não-política esportiva do Brasil.

Menos mal, que ao fim, Oscar mentiu para Kobe Bryant ao dizer, numa reportagem para lá de simpática, que o maior astro do basquete atual é melhor do que Michael Jordan, o equivalente a dizer que Kaká é melhor que Pelé.

E tão ruim como ver os chineses dizerem que dublaram a cantorinha que nos encantou e editaram até os fogos de artíficio.

Pára o mundo, por favor.

Eu quero descer.

E Guanajuato parece o lugar ideal para tal

Iara vai ao STF contra governo por não cumprir inclusão racial

O Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara) entrou com uma petição no Supremo Tribunal Federal (STF) para que 17 ministros do governo Luiz Inácio Lula da Silva respondam por não cumprirem metas de inclusão racial em gabinetes e secretarias.


A entidade se baseia em um decreto do governo Fernando Henrique Cardoso, assinado em 2002, que prevê, no âmbito do Programa Nacional de Ações Afirmativas, mecanismos que garantam a realização de metas percentuais de participação de afrodescendentes, mulheres e pessoas portadoras de deficiência no preenchimento de cargos em comissão, como os chamados DAS (Grupo-Direção e Assessoramento Superiores).

Na última semana, por exemplo, o presidente Lula criou por medida provisória e sem concurso quase 300 novos cargos públicos, com salários que variam de R$ 1.977,31 a R$ 10.448. Em nenhum dos casos, no entanto, foi fixada qualquer meta de inclusão racial, social ou de gênero.

"Não é cota, mas tem que incluir (os afrodescendentes) . Só por descumprir a lei já é improbidade (administrativa) ", explicou o advogado do Iara, Humberto Adami. Segundo ele, o presidente Lula anunciou publicamente junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT) o "compromisso pessoal" de combater o racismo no ambiente de trabalho. O Palácio do Planalto não comentou o caso. Procurada, a Secretaria Especial de Promoção de Igualdade Racial (Seppir) informou que iria se inteirar da ação antes de se manifestar.

São citados no processo os ministros Fernando Haddad (Educação), Celso Amorim (Relações Exteriores), José Gomes Temporão (Saúde), Tarso Genro (Justiça), Guido Mantega (Fazenda), Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), Sérgio Rezende (Ciência e Tecnologia), Carlos Lupi (Trabalho), Alfredo Nascimento (Transportes) , Edison Lobão (Minas e Energia), Paulo Bernardo (Planejamento) , Hélio Costa (Comunicações) , Miguel Jorge (Desenvolvimento) , Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário), Nelson Jobim (Defesa), Geddel Vieira Lima (Integração) e Márcio Fortes (Cidades). Também estão elencados no processo os ex-ministros Gilberto Gil (Cultura), Marina Silva (Meio Ambiente), Luiz Marinho (Previdência) e Marta Suplicy (Turismo).

Por decisão da ministra Ellen Gracie, do STF, nenhum dos ministros ainda foi notificado, o que juridicamente significa que não se pode considerar que haja um processo contra cada um deles. Os ministros da Justiça, Saúde e Trabalho confirmaram não terem sido notificados.

De acordo com o Iara, caso o Plenário do STF rejeite dar seguimento ao processo, o caso poderá ser encaminhado à Organização dos Estados Americanos (OEA), que, ao julgar a questão, pode estabelecer multa à União por descumprimento do decreto e aos próprios ministros do STF por omissão.

"Com o nosso processo o ministro vai ficar pessoalmente responsável, e não a União, que é um saco sem fundo e não paga nunca", avalia Humberto Adami, que informa que a própria OEA já considerou o Poder Judiciário e o Ministério Público brasileiros "racistas institucionais" .

"Esse descumprimento é prejudicial ao País, não só pela visão política que passa a ter, mas também porque acaba por transferir para o contribuinte o custo da eventual penalidade", disse o advogado.

Redação Terra

sábado, 2 de agosto de 2008

"Se Obama for presidente, a Casa ainda será Branca?"

O artigo abaixo foi publicado no site do Azenha. Só um comentário da minha parte: a questão racial esta posta e ponto final, o grande problema do Obama que já havíamos denunciado aqui, foi criar uma América pós-racial que definitivamente não existe. Foi isso que seu antigo pastor tentou mostrar. Agora ele esta mal com os racistas (como era previsível) e começa a ficar com a imagem arranhada entre os eleitores negros (afinal é uma ducha de água que um dos seus, em caso de ser eleito, tenha essa vitória creditada ao fato de que embranqueceu para tanto).
Aliás esse papo de não racializar a campanha só interessa aos racistas, bem parecido com os debates sobre cotas no Brasil. O pertencimento a um coletivo racial é conseqüência do olhar externo sobre ele, é resultado da exclusão, da discriminação, do maltrato. Afinal como bem disse um filósofo judeu:
O fenótipo judeu que talvez, eu não sei, me seja próprio, concerne, como problema, aos outros e somente se torna assunto meu na relação objetiva que eles pretendem me impor. (Améry, 2001, p. 187).

"Se Obama for presidente, a Casa ainda será Branca?"


Começou mais cedo do que eu imaginava. A título de responder a um discurso de Barack Obama a campanha de John McCain injetou a questão racial na disputa pela Casa Branca.

Fez isso de maneira cínica e eficaz, como sempre fazem os republicanos, que operam uma verdadeira "máquina de moer carne" apelando aos instintos mais selvagens dos eleitores.

Na campanha de 1988 ficou famoso o caso de Willie Horton. Era um condenado que participava de um programa que dava liberdade aos presos em alguns fins de semana, programa que tinha o apoio do então governador de Massachussets, Mike Dukakis, que se tornou candidato democrata à Casa Branca. Os republicanos trouxeram Horton para a campanha eleitoral, sugerindo que Dukakis era mole contra o crime, muito liberal e, portanto, incapaz de ser presidente dos Estados Unidos.

Isso era o que dizia o texto. Mas as imagens foram usadas de forma a sugerir aos eleitores brancos: se Dukakis for eleito ele vai soltar todos os assassinos negros que estão na cadeia.

É óbvio que contra Obama os republicanos não poderão fazer o mesmo. Eles estavam apenas esperando uma oportunidade para trazer a questão racial de volta. Num discurso recente o democrata disse que a campanha republicana tentaria pintá-lo como uma aberração, alguém que "não se parece com os presidentes que figuram nas notas do dólar". Foi o suficiente para que assessores de McCain - e o próprio candidato - atacassem Obama por supostamente ter trazido a questão racial para a campanha.

Aos republicanos o assunto interessa por um motivo muito simples: os eleitores de classe média baixa são os mais suscetíveis à insegurança gerada pela crise econômica. E a tendência deles seria votar por mudança. É aí que entra a questão da identidade. O que a campanha de McCain quer fazer é dizer a esse eleitor: mudança, sim, mas com alguém que seja como você, com o qual você tenha identidade. Esse é um bloco suficientemente grande de eleitores para decidir a eleição.

É óbvio que os republicanos não vão abraçar o texto que foi visto no Texas - um dos lugares mais racistas dos Estados Unidos: "Se Obama for presidente... ainda chamaremos a Casa de Branca?". Dirão a mesma coisa de forma subliminar.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

As eleições municipais



Ontem ocorreu o primeiro debate para as eleições de BH, como nós os belohorizontino gostamos de falar. Que coisa mais chata e morna. Aliás se é para criar regras contra o debate para que faze-lo? Fora isso a mediocridade em termos gerais dos candidatos.
Sob o "debate" em si, algumas palavras. Dos 9 candidatos foram 8, deste destacaremos alguns:
Sérgio Miranda: ficou claro que é o mais preparado, o mais estudioso e conhecedor dos problemas e soluções para a cidade. No entanto, falta ao Sérgio do PDT o fervor do Sérgio de outras épocas, parece sempre deslocado como aliás é sua campanha: deslocada e tímida, quando acordarem pode ser muito tarde. Sérgio realmente é de outra época e foi capaz de usar seu tempo em uma das perguntas para elogiar, por exemplo, a participação e a legitimidade do PCO e de suas propostas (que visivelmente era alvo de chacotas por parte dos jornalistas e de outros candidatos). Por enquanto esse blog continua apoiando por coerência política do Sérgio. Um dias desses conto aqui, uma divertida discussão que dividiu em dois grupos velhos amigos de militância na esquerda, com uma parte inclusive eu defendendo a coerência e o voto no Sérgio e outra parte, os eleitores de Jô Morães apesar do PC do B.
Márcio Lacerda- o prefeito já eleito- pelo menos para a mídia mineira: quem é essa figura exógena a cidade. Pior, nem mesmo midiatico ou bom de comunicação o cara é. Achava que ele era aquela espécie de empresário bom de bico, mas pelo debate de ontem não parece ser o caso. Já começo a acreditar apesar dos apesares ser possível derrotar o imenso poderio financeiro e político do candidato, do prefeito e do governador.
Leonardo Quintão: o perigo mora ai. O Garotinho Jr ao contrário de Márcio é muito bom de mídia, é o jovem, o que deve se apresentar sobre o manto de ser o diferente de todos os que estão ai. Mas no fundo como ficou claro no debate apóia tudo que esta ai, o governo do estado e o governo federal e tudo mais que se pode apoiar e tirar vantagem na confusão ideológica dos dias atuais.
Gustavo Valadares: perdido, totalmente perdido. Fraco. Mais uma vez fica claro como os candidatos do DEM tem dificuldade de defender a ideologia de seu próprio partido. BH continua sentindo falta de um autêntico candidato de direita.
Vanessa Portugal: brava e corajosa. Usou seu tempo para demonstrar que Jô e Larceda são lados diferentes da mesma moeda. Aliás, Vanessa foi vítima de um ataque pérfido e covarde pelo Sr. Teodomiro Braga, poucas vezes vi uma atuação como a desse "repórter", diante da incompetência do Lacerda ele então fez às vezes de principal atacador dessa candidata. A direita não é boba não. Enxerga longe. Ah, tudo porque esse senhor tomou as dores dos demais candidatos quando Vanessa disse que as empresas de ônibus financia a campanha municipal e em troca comanda a política de transporte, o engraçado é que os demais candidatos não se opuseram a declaração da candidata, Valadares até defendeu que haja doações desse setor. Não contente o repórter interrompeu a candidata em sua resposta para questionar a seriedade da mesma.
Jô Morães: a liderança fez bem a Jô, que apesar de não se apresentar de forma arrogante, conseguiu dominar o debate. Além disso, a candidata tem excelente retórica, dessa forma mesmo quando se fazia uma acusação ou pegadinha a ela, a sua resposta invertia a pergunta inicial. Diante da ineficácia de Lacerda e de sua boa retórica Jô pode sim ir longe nessa eleição. De forma resumida, a sensação depois do debate foi a de que Jô já esta lá e alguns dos outros poderá acompanhá-la no segundo turno.
Jorge Periquito: o idiota, o óbvio ululante. O gênio do senso comum. Deverá na fase aguda da campanha ser a boca de aluguel de Lacerda, ou seja aquele que baterá nos candidatos que prejudicarem o prefeito já eleito de BH.