terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Somos Todos Gaza IV

Antes do texto de Gary Young, do The Guardian de Londres. Sugiro a todos uma visita ao sempre ótimo blog do professor Ildebar Avelar. No atual momento esse se tornou mais um campo de resistência Palestina: http://www.idelberavelar.com/
"Enquanto a situação em Gaza for de massacre do exército invasor israelense sobre a população civil, este blog deverá funcionar como central de tradução e disseminação de textos, vídeos e informações sobre a matança, com um ritmo bem mais acelerado de postagem e caixas de comentários fechadas. Esta última escolha tem sido, com exceções ocasionais, a mais comum neste blog para o tema da Palestina Ocupada. Ela não está em discussão. "
Preconceito não traz segurança Israelenses, a guerra ao terror fracassou
Gary Young*

No dia de ano-novo, Atif Irfan e sete membros de sua família embarcaram em um voo da AirTran, em Washington. Caminhando pelo corredor, Irfan questionou se a parte traseira do avião não seria o melhor lugar para se sentar. Sua cunhada disse que a considerava a parte mais segura da aeronave, "caso algo aconteça". A conversa foi ouvida por duas adolescentes que repararam nas barbas dos homens e nos lenços das mulheres e viram uma família de terroristas suicidas - com três criancinhas de 2 a 7 anos. As mocinhas contaram a seus pais; seus pais, ao comissário de bordo; o comissário de bordo, a agentes federais a bordo; os agentes ligaram para o FBI. A família foi detida para averiguações e depois liberada.
Mas o avião decolou sem eles. O suplício da família Irfan seguiu uma lógica própria e humilhante. E , no entanto, sete anos após o 11 de Setembro, esse não foi um incidente isolado. Preventivo, desproporcional e discriminatório, ele diz muito sobre os valores da sociedade em que essas adolescentes americanas viveram durante boa parte de suas vidas. Um mundo que iguala muçulmano a terrorista, e confunde o civil e o combatente pegando o medo e o preconceito e os entregando ao Estado. A única coisa que não fez desse particular incidente uma metáfora perfeita da guerra ao terror é que ninguém foi morto ou desapareceu. Mas não há nada de exclusivamente americano nisso.
Como a Nike e o McDonald?s, a guerra ao terror pode ter começado aqui, mas rapidamente tornou-se global. Logo após os ataques de 2001, o presidente George W. Bush viu-se em companhia de gente como o presidente do Zimbábue, Robert Mugabe, e o ex-primeiro-ministro da Índia Atal Bihari Vajpayee. No entanto, poucos países o acompanharam como Israel. "Vocês, nos EUA, estão numa guerra contra o terror", disse Ariel Sharon após sair da Casa Branca depois dos atentados suicidas em Haifa e Jerusalém, em dezembro de 2001. "Nós, em Israel, estamos numa guerra contra o terror. É a mesma guerra." O problema é que nos últimos sete anos, essa guerra foi completamente desacreditada - não só moralmente, mas militar e estrategicamente. Ninguém dá ouvidos a moderados, e menos ainda à razão, quando bombas estão caindo e pessoas morrendo. Isso vale tanto para os foguetes que mataram um punhado de israelenses como para a barragem de bombas e agora tanques que mataram centenas de palestinos. Ao eliminar qualquer perspectiva de negociação, a violência fortaleceu os extremistas. A intenção de Israel pode ter sido alçar a facção moderada Fatah que hoje governa a Cisjordânia. Mas a vitória do Hamas nas urnas foi uma consequência direta do desprezo que os israelenses mostraram por eles.
Enquanto isso, a guerra no Iraque deixou o Irã - patrocinador do Hezbollah e do Hamas - com muito mais influência na região. Em quase todo lugar, incluindo nos Estados Unidos, a guerra ao terror é vista hoje como um erro colossal. Só Israel não percebe - e está fadado ao fracasso pelas mesmas razões que os EUA fracassaram. Diplomaticamente, os esforços israelenses para vender seus bombardeios e a atual invasão de Gaza como uma extensão direta da guerra ao terror têm sido clamorosos. O bombardeio de casas, mesquitas e postos policiais foi descrito como a destruição da "infraestrutura do terror". A despeito da condenação internacional, a chanceler e líder do Partido Kadima, Tzipi Livni, vem dizendo que as ações de Israel o colocam firmemente na comunidade de nações e deixam os moradores de Gaza e seus governantes, democraticamente eleitos, de fora. "Israel faz parte do mundo livre e combate o terrorismo. O Hamas, não", disse ela. A partir daí, estamos a um passo de informar o mundo de que ou "vocês estão conosco ou estão com os terroristas". "Cada um precisa escolher um lado", disse Tzipi. Ela está certa, as pessoas precisam escolher lados. Até agora, porém, não tem sido o seu. Sete anos após o 11 de Setembro, o mundo tem uma boa ideia do que virá em seguida e não quer fazer parte disso. A guerra ao terror acabou. Ela foi perdida.
Pela primeira vez, depois de muito tempo, isso parece ser claro até nos EUA. Uma pesquisa de Rasmussen mostra uma opinião pública americana menos indulgente com a agressão israelense do que muitos acreditavam. A opinião sobre o bombardeio de Gaza está dividida quase pela metade, 44% apoiando a ação de Israel e 41% dizendo que o governo devia ter tentado uma solução diplomática. Na falta de um debate franco sobre o Oriente Médio, cresce o espaço de manobra para o presidente eleito Barack Obama buscar uma política mais imparcial para a região. Isso aumentaria a influência dos EUA. Maiorias em sete nações árabes dizem que sua opinião sobre os EUA melhoraria se Washington pressionasse Israel a obedecer as leis internacionais no tratamento dos palestinos - mais do que aqueles que dizem o mesmo sobre o fechamento da prisão de Guantánamo, segundo o Gallup. Essa é a mudança de que os Estados Unidos e o Oriente Médio precisam. É também a mudança em que a maioria do restante do mundo quer acreditar.
*Garry Young é colunista do jornal britânico The Guardian

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