segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Sobre o post abaixo: Polêmicas e das boas

No post abaixo em meu introtio iria citar nominalmente meu amigo e entendido de sociologia da cultura e principalmente da relação música e sociedade Daniel Martins, depois por uma questão de redação preferi reescrever o introito e retiorei a parte em que o citava como alguém que poderia dar um belo pitaco sobre o texto do Hetrz. Nem precisou citar, pois como esperado o cara fez isso mesmo. Reproduzo abaixo, o longo comentário dele a respeito do texto e depois um comentário meu e a réplica dele. Que bom que rolou uma conversa legal a partir do texto do Hertz. A resposta do Daniel
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É, realmente é um assunto polêmico... não sei até onde essa "parceria" nike/racionais pode ir... aliás, não sei quais são os termos disso... mas me lembrei imediatamente do Run DMC e da Adidas, que em meados dos anos 80 fizeram algo parecido. Os caras já usavam produtos da marca. Aí a Adidas viu a brecha e começou meio que a patrociná-los... quando se ouve os discos deles pré e pós Adidas não se percebe mudança na temática ou forma como esta é abordada.O Racionais teve, tem e terá um papel muito importante junto a periferia porque fala a língua deles, e de forma genuína. Eles são periferia. E não é periferia da Regina Casé que passa no Fantástico. Não sei se vc viu o Roda Viva com o Mano Brown. É só ouvir as palavras do cara. Pode ser que a Nike tenham mil e um motivos obscuros sob essa parceria, e não me espantaria se isso ocorresse, só não acredito que o Racionais se deixaria levar, sabe? Parece que os caras ou são ingênuos ou vendidos. Se quisessem isso teriam feito antes, na época do Diário de um Detento, com a música estourada. Os caras nunca pisaram na Globo. Quando foram na MTV receber prêmio chutaram o pau da barraca.Agora, encontros com setores do governo, ongs e afins só mostra que o Hip Hop não só abriu uma porta como passou por ela. Hoje ele é reconhecido. Se a Globo faz parceria com a CUFA, só mostra que a CUFA se fez notar. Se programas como o Fica Vivo fazem uso do Hip Hop, só mostra que o mesmo se tornou legítimo representante da periferia. Quando você ouve um MV Bill falando, vê que o cara aproveita o espaço que tem na mídia pra falar tudo o que antes ninguém queria escutar. E isso é importante. Já ouviu alguns dos grupos surgidos nesse Vozes do Morro? Tem coisas ótimas lá. Projeto do governo do Estado e Globo... O programa do Rappin Hood na Cultura é outro. Programas assim tinha apenas o Yo! MTV Raps, que passava meia-noite, na tv a cabo...Você me conhece e sabe que não defendo nem governos, globo, nike nem ninguém. Só acho que os grupos aprenderam a usar a mídia, as parcerias e afins a seu favor. Quando vejo o Hertz falar que o Hip Hop militante do Nordeste virou pó, acho exagerado. Não acredito que tenha desaparecido, justamente do Nordeste. Se olharmos para Pernambuco temos alguns dos artistas que se mostraram mais engajados nos últimos anos. Mesmo na Bahia, dominada pelo axé, encontramos coisas interessantíssimas nesse sentido. Claro que não tocam nas rádios FM mercadológicas, mas tocam onde mais é preciso que toquem: nas periferias.Concordo com muita coisa que ele fala. Aliás, fala com muita clareza. Só não consigo concordar muito com essa face Adorniana que ele apresenta. Mostrando o morador de periferia como alguém facilmente manipulável. Como ele mesmo citou, as inúmeras revoltas ocorridas a partir de periferias mostra que a coisa não é bem assim. E se ele espera que a periferia brasileira comece uma revolução a partir da periferia, via Hip Hop, acho que ele tá perdendo o bonde da história, porque acredito que essa revolução já começou.Ah, só mais uma coisa. Querendo ou não, quando um artista grava um disco, seja o Run DMC, Racionais ou o próprio Hertz, o mesmo já passa a ser inserido na lógica do capitalismo, pois colocará seu disco à venda. Estando à venda pode ser consumido por qualquer um. Sua arte se transforma em mercadoria. Querendo ou não, gostando ou não, ele é mais uma das engrenagens desse mecanismo que ele tanto critica.Nem sei mais o que escrever. Gostei muito de várias coisas que ele fala sobre a periferia, opressão, racismo e afins. Só achei que pisou na bola ao falar dos Racionais e demais grupos de Hip Hop da forma como falou. Se existe um gênero no Brasil onde a imensa maioria dos artistas se mantem fiéis a suas origens, comprometidos com a realidade de onde surgiram, esse gênero é o Hip Hop.Acho que é isso...
Daniel Martins
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Minha réplica
Só discordo de sua leitura na parte em que Voce lê a opinião dele sobre a revolução. Na minha leitura não entendo que o Hertz ache que a revolução futura se dará na periferia, para ele essa revolução já esta acontecendo, no entanto é um processo dialético, que em momentos de crise como o atual acaba por ser disputado, nesse momento é que o capital utilizará de todas as suas manhas para se manter no poder. Enfim o marxismo-leninismo em sua leitura mais clara, mas até isso achei legal pois ultimamente nem isso se faz(mesmo que discordemos da leitura especificamente leninista da obrade Marx). é nisso que vejo força no texto, qto ao fato da Nike patrocinar ou seja lá o que for os Racionais tbém não significa cooptação dos mesmos, para mim podemos fazer duas leituras: uma simbólica que o próprio Hertz fez e uma segunda (que até me interessaria mais como antropólogo) diz respeito nem sei como nominar bem isso (algo que Vc estudou) um conflito entre uma idéia de purismo (o que antropologicamente é condenável, que estudei e demonstrei em relação ao patrimônio imaterial afro-brasileiro) e uma outra não purista. Veja bem aqui o purismo não é estético, pois o próprio Hertz reconhece a importância dos Racionais e da legitimidade dos mesmos e sim eminentemente ideológica. No fundo é isso um conflito ideológico, pois se voltarmos a entrevista do Brown que Vc cita vamos perceber que Brown (por opção obviamente) é alguém que poderíamos dizer partidariamente confuso, coisa que Hertz não o é, definitivamente não o é. Hertz me lembrou os melhores momentos do pessoal do Partidão e sua visão sempre interessante e coerente da realidade.
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A tréplica do Daniel
Sobre a idéia do purismo, é extremamente complicado falar em purismo no Hip Hop pois este é um gênero que já nasce híbrido (como tantos outros). Tem raízes na Jamaica, nas ruas de Nova Iorque, chega ao Brasil onde é interpretado e adquire as cores locais. Um gênero que tem por natureza a característica de fundir elementos. No caso da música em si, basta ver a mistura que D2 faz com o samba. Se D2 já não contar muito na opinião de alguns, citemos Afrika Bambaataa em seu seminal Planet Rock onde aparece um sampler do Kraftwerk. Mistura. O Hip Hop traz isso em seu âmago. Por isso é adaptável. Por isso se adequa tão bem à diferentes realidades. Querer engessar o gênero em uma forma única só fará com que o mesmo perca o vigor. Não é atoa que o Hip Hop não se resume à música tão somente. Amplia os horizontes da expressão artística do indivíduo, permitindo que o mesmo coloque em prática suas idéias da maneira que achar melhor. Grafismos, rimas, passos... Guardadas as devidas proporções e resguardados os contextos históricos, o Hip Hop abriga hoje o "faça você mesmo" que o Punk trouxe à tona. Permite que qualquer um, em qualquer parte, expresse suas opiniões da maneira que puder e quiser.
Daniel Martins

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