sábado, 6 de dezembro de 2008

Ainda sobre o fim da Tribuna da Imprensa

Sobre o post abaixo. Um texto bem explicativo do ótimo Argemiro Ferreira, fiel soldado da Tribuna.
Ainda o passado patético da mídia golpista

(A manchete acima e as demais reproduzidas abaixo escancaram o coro unânime dos jornalões em 2006, no desespero para impedir a reeleição de Lula - exatamente o contrário da submissão dócil aos ditadores)
Há mais reflexões a fazer sobre os quase 60 anos da Tribuna da Imprensa e o papel submisso da imprensa golpista, que se acha valente hoje na trama contra um governo democrático apoiado por 80% da população mas nos 20 anos da ditadura militar, depois do golpe de 1964 contra um presidente legítimo, aplaudiu cada um dos cinco ditadores que matavam e torturavam (além de censurar a própria mídia).
Da mesma forma como hoje chega ao cinismo de denunciar inexistentes ameaças à liberdade de imprensa, naquele passado sinistro recebia visitas diárias de censores militares à redação e jurava ao mundo, em suas primeiras páginas, haver no Brasil um regime democrático com imprensa livre. Por festejar o falso milagre brasileiro dos ditadores, como foi lembrado antes, essa mídia covarde ganhou seus atuais impérios.
Os primeiros jornais a desaparecerem depois de 1964 foram Última Hora e Correio da Manhã. Ousaram desafinar no coro da submissão aos novos donos do poder. O caso da Última Hora - a cadeia de jornais criada por Samuel Wainer - foi expressivo ter sido a única grande empresa jornalística a repudiar o golpe, já que apoiara o governo João Goulart, derrubado pelos generais.
Da resistência à promiscuidade
O Correio, ao contrário, era duro na crítica, tendo dado um “Basta!” e gritado “Fora!” em dois editoriais históricos. Mas teve o mérito de se indignar contra os excessos e abusos do novo regime, inclusive a primeira onda de torturas. Com o dono da UH exilado em Paris - até inclinado, inicialmente, a fazer concessões para retornar - a responsabilidade da resistência ficou para o Correio.
O cronista Carlos Heitor Cony agigantou-se no desafio, apoiado pela equipe - Edmundo Moniz, Otto Maria Carpeaux, Márcio Moreira Alves, Hermano Alves, etc, Niomar Moniz Sodré à frente. Esgotada sua fase inicial, o regime reciclou-se com o Ato Institucional 2 (fim dos partidos e cassações em seguida à derrota eleitoral de 1965) e o AI-5 de 13 de dezembro de 1968, já sob o segundo ditador (Costa e Silva).
Por causa de sua resistência consequente, o Correio passou a viver sua agonia lenta nas mãos de empreiteiros ligados ao regime (os irmãos Alencar-Bobagem), que o arrendaram para obter favores oficiais e adoçar negociatas. Na mesma data do Ato 5, o Jornal do Brasil lançou então seu desafio histórico, a edição do dia 14, pessoalmente ordenada pela condessa Pereira Carneiro.
Com a prisão do editor Alberto Dines e do diretor José Sette Câmara, o JB recuou. O preço da libertação dos dois foi a rendição do jornal. Encerrou-se então o único desafio real do JB à ditadura. Para a Tribuna, determinada a resistir, o 13 de dezembro significou o início de 10 anos de censura - e da sucessão de prisões e confinamentos de Helio Fernandes.
Prédios novos e Brasil grande
O diretor da Tribuna fora impedido três anos antes de ser candidato ao Congresso - na mesma eleição que dera cadeiras a dois jornalistas do Correio na Câmara e a mais dois na Assembléia do Rio. E enquanto tudo isso acontecia, O Globo nada tinha a reclamar, ao contrário. O seu novo canal de televisão ia muito bem, obrigado - em intimidade promíscua com a ditadura militar.
Foi a fase das definições, cada um vendia a alma ao diabo como podia. A Veja começava. O Globo, empurrado pelo parceiro Time-Life, engordava sua TV, porta-voz oficiosa da ditadura. A Folha de S. Paulo preparava-se para descobrir a vocação para o poder, através de um dedo-duro residente. O concorrente Estado de S. Paulo tinha sua facção no regime, apesar de prejudicado pelas ligações com Carlos Lacerda, em desgraça.
Sob censura, a Tribuna ficou isolada - sem qualquer solidariedade dos outros, expectadores omissos. Alternativos novos nasciam e morriam (Folha da Semana, Politika, Crítica, etc.), sem falar no miraculoso Pasquim, que apostou no ridículo do regime ao nascer, deu um salto para 200, 300 mil exemplares e recuou a menos da metade ao ser vítima de censura e repressão.
Opinião nasceu no fim de 1972, quando os jornalões festejavam em seus prédios novos a euforia do Brasil Grande do ditador Garrastazu Médici e omitiam as informações sobre torturas e abusos. Previa-se uma venda de 20 mil exemplares, mas ela cresceu imediatamente para 40 mil, tal era a fome de notícias verdadeiras da parte dos leitores e a sonegação delas pelos jornalões.
A intimidação pelo exemplo
Como a circulação de Opinião, mesmo sob censura (imposta a partir de seu número 8), se mantinha, o jornal viu o castigo ampliar-se com censura mais devastadora - a cargo do Centro de Informações do Exército (CIEx), em Brasília. A receita serviria ainda, depois, para outros que se atrevessem a imitar o exemplo - Ex, Extra, Movimento, Reunião, Versus, Argumento, Coojornal, Em Tempo, Cadernos de Opinião, etc.
Os jornalões fizeram os piores papéis - deles, só Estado de S.Paulo e Veja chegaram a ter censura direta (por pouco tempo). O JB foi ao extremo de entregar à Polícia uma primeira página inteira para as “confissões” de um espião da CIA, Adauto Santos, infiltrado no PCB (até a diagramação viera pronta). E quando o ex-deputado Rubens Paiva morreu de tortura o JB fez ao regime o favor de assumir como sua a versão oficial de que ele tinha sido baleado ao tentar fugir.
O diretor-presidente M. F. Nascimento Brito não hesitou em sair pelo mundo a negar (até como diretor da Sociedade Interamericana de Imprensa) que havia censura no Brasil. Achava que em troca teria sua rede de TV para competir com a Globo. Mas foi impossível bater a subserviência dos Marinho, cuja façanha maior fracassou em 1982 - a fraude para derrotar Leonel Brizola no Rio e “eleger” o candidato da ditadura, Moreira Franco (escândalo Pro-Consult).

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