terça-feira, 12 de outubro de 2010

N. Sra. Aparecida, eleições, Jesus de Nazaré, os juízes e médicos brasileiros e o aborto

Feriado de N. Sra. de Aparecida, padroeira do Brasil, pelo menos do Brasil Católico, este ano, tal feriado ganhou uma nova dimensão, desde que, como disse certo cronista, fundamos a República Fundamentalista do Brasil. Nesta República, os cristãos e, diga-se de passagem, os bons cristãos, ditam as regras e nós os demais, cristãos ruins e não-cristãos devemos obedecer sob a ameaça de irmos para o inferno. Estranho tem sido este começo de primavera, onde uma questão, sim importante. Uma questão sim de ordem política, se encontra resumida a posições fundamentalistas de um grupo. Ora o debate sobre o aborto deve ser um debate e, não um monologo. Deve-se apoiar em questões de vários matizes, inclusive a religiosa, mas não pode se assentar somente nela. Deve ser plural e diverso, pois na pluralidade e na diversidade é que podemos nos argüir e nos questionar. Pode e deve ser tema político mas deve ser tema de uma grande política e não de uma política pequena, rasteira. Deve-se acima de tudo ser debatido, para além da via religiosa, por seus matizes culturais, econômicos, educativos, de saúde publica, de direitos individuais e coletivos, pelo aspecto dos direitos humanos. Mas o que se vê é apenas um apequenar do debate levado a cabo, por dois candidatos, que se mostram menor do que o cargo que almejam ocupar. Que se mostram demagogos, visto que, no fundo, no fundo defendem hoje uma idéia da qual tinham certas dúvidas ou objeções no passado. Tanto um como o outro ao ceder ao fundamentalismo, sujam suas biografias, apelam para uma saída fácil e nos submetem a um caminho perigoso que é aquele ditado pela fé. Como disse Obama, em sua campanha a presidência no celebre debate com os religiosos, a America não é mais uma nação crista, apenas crista é também uma nação judia, islâmica, budista, ateia, agnóstica e o governo do EUA deve se dirigir a todas as nações norte-americanas, falta algo desta grandeza em nossa campanha. O mesmo Obama neste cerebre discurso conclamava aos norte-americanos cristãos a lerem a Bíblia, pois segundo ele, existia varias leituras e vários cristianismos. A mesma bíblia do deuteronômio e a bíblia do Sermão da Montanha. Pois bem, seguindo o conselho de Obama, vamos à bíblia, aquela que com certeza não representa o Jesus dos Fundamentalistas, pois o Jesus de Nazaré os desagrada em grande monta, devem preferir o Jesus Cristianizado dos poderosos e dos poderes.

Ao contrario da sede de ódio, vingança, acusações e julgamentos que estamos assistindo, em Mateus, Jesus é cáritas e misericórdia é a fundação de um mundo novo. O mundo da compreensão e do afeto. Eis que:

Mateus capitulo 05

38 Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente.
39 Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal; mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra;
40 E, ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa;
41 E, se qualquer te obrigar a caminhar uma milha, vai com ele duas.
42 Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes.
43 Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo, e odiarás o teu inimigo.
44 Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus;

Ou Mateus capitulo 07

1 NÃO julgueis, para que não sejais julgados.
2 Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós.
3 E por que reparas tu o cisco que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho?
4 Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do teu olho, estando uma trave no teu?
5 Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar o cisco do olho do teu irmão.
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Em pesquisa coordenada pela Unicamp, entre os 1.148 juízes que responderam a questionários enviados pelos Correios, 207 (19,8%) relataram que já tiveram parceiras que engravidaram "sem querer". Nessa situação, 79,2% abortaram.Das 345 juízas que participaram do estudo, 15% disseram que já tiveram gravidezes indesejadas.Dessas, 74% optaram pelo aborto.

Apesar de não representar a opinião da maioria dos magistrados (só 14% deles participaram da pesquisa), o trabalho é o primeiro a retratar a opinião pessoal daqueles que operam as leis sobre o aborto, tema que ganhou força no debate eleitoral.

Na avaliação da antropóloga Debora Diniz, professora da Universidade de Brasília, o dado revela uma questão básica sobre temas moralmente sensíveis: uma coisa é como as pessoas agem e conduzem suas vidas, a outra é o que elas consideram moralmente correto responder sobre o tema. "Aos 40 anos, uma em cada cinco mulheres já fez aborto no Brasil. Se perguntássemos a essas mesmas mulheres se elas são favoráveis ao aborto, a resposta seria incrivelmente diferente e contrária ao aborto", afirma Diniz, também pesquisadora da Anis (Instituto de Bioética Di reitos Humanos e Gênero).

Incoerência? Para a antropóloga, não. Ela explica que temas com forte regulação moral, em particular pelas religiões, geram uma expectativa nas pessoas de haver respostas "corretas", que indicariam que elas são "pessoas boas"."Cria-se uma falsa expectativa de julgamento moral do indivíduo. Por isso, um plebiscito sobre aborto é algo desastroso. As mulheres abortam, seus companheiros as ajudam e as apoiam, mas ambos serão contrários à legalização do aborto." Hipocrisia? Na opinião do juiz João Ricardo dos Santos Costa, vice-presidente de direitos humanos da AMB, sim. "A sociedade é hipócrita e individualista. Não conseguimos nos colocar na condição do outro."

Ele provoca. "Até padres quando se veem em uma situação em que suas parceiras engravidam optam pelo aborto para manter a sua integridade religiosa [permanecer na igreja]. Os juízes são como todas as pessoas. Têm suas vivências e cargas de preconc eitos", diz ele. A pesquisa com os magistrados e promotores, publicada na "Revista de Saúde Pública", se baseou em questionários enviados a 11.286 juízes e 13.592 promotores, por meio das associações que representam as categorias. A taxa de resposta entre os juízes foi de 14%, e entre os promotores, de 20%.

Seis anos atrás, o médico Anibal Faúndes, professor aposentado da Unicamp e coordenador do estudo com os magistrados e promotores, coordenou uma outra pesquisa com seus colegas de profissão, os ginecologistas e obstetras. Um total de 4.261 profissionais responderam a questionários enviados pela federação que representa a categoria (Febrasgo). Um quarto das médicas e um terço dos médicos relataram já ter enfrentado uma gravidez indesejada. A maioria (80%) optou pelo aborto. Mesmo entre os profissionais para os quais a religião era muito importante, 70% escolheram interromper a gravidez. Quando a questão era a gestação indesejada de uma paciente, 40% dos médicos disseram já terem ajudado a mulher (indicando profissionais que faziam o aborto). A taxa subiu para 48% quando se tratava de um familiar e de quase 80% quando se tratava da sua parceira. "As mais profundas convicções se rendem frente a circunstâncias absolutamente excepcionais. Todos somos contra o aborto, mas há situações em que ele é um mal menor", diz Faúndes.

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