quarta-feira, 26 de novembro de 2008

MANIFESTO DOS QUILOMBOLAS GAUCHOS


MANIFESTO
Porto Alegre, 20 de novembro de 2008.

Os representantes das comunidades quilombolas rurais e urbanas, a Federação das Associações das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio Grande do Sul, ativistas, organizações e entidades do movimento social negro e movimento social em geral, presentes no I Encontro Municipal das Comunidades Quilombolas Urbanas e Rurais do Município de Porto Alegre, reunidos nesta data simbólica, 20 de novembro de 2008, vêm a público denunciar:
O descompromisso do Estado Brasileiro e dos Governos (Federal, Estaduais e Municipais) para dar efetividade ao artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal:

Artigo 68. Aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.

Somos hoje no país, mais de três mil comunidades, sendo que dessas, pouco mais de uma centena foram tituladas e aqui no Estado, segundo o INCRA, 135, sendo que nenhuma titulada. Estamos juntos vindo a público e perante a população e o povo brasileiro denunciar a grave situação de ataque aos direitos das comunidades quilombolas.
As comunidades quilombolas vêm sofrendo forte ataque aos seus direitos nas várias esferas de Estado, como a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) ajuizada pelo DEM (DEMOCRATAS - ex-PFL); o Projeto de Decreto Legislativo (PDC nº 44/2007) de autoria do Deputado do PMDB de Santa Catarina, VALDIR COLATTO. Todos estes ataques visam retirar a efetividade do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal (que garante a titulação das terras de quilombo), bem como atacam conquistas expressas no Decreto 4887/2003 (que regulamenta procedimentos para demarcação e titulação). Tais ataques refletem os interesses dos grandes latifundiários rurais e urbanos, grandes empreiteiras, empresas de papel e celulose e multinacionais, contando com a cumplicidade das grandes empresas de comunicação (escrita e falada). São essas pressões e a falta de compromisso dos Governos (Federal, Estaduais e Municipais) que explicam a recente alteração na Instrução Normativa nº 20 do INCRA, pelo Governo Federal, e a edição da Instrução Normativa nº 49 do INCRA, burocratizando e retardando o processo de demarcação e titulação das terras quilombolas, que já é lento, pois nos últimos oito anos somente sete comunidades foram tituladas. Tal alteração se deu a revelia e contra os interesses das comunidades quilombolas, o que gerou a correta denúncia do Estado Brasileiro perante a OIT (Organização Internacional do Trabalho), por descumprimento da convenção 169 da OIT, por parte de várias entidades e organizações do movimento negro e quilombola.
Recentemente, sob o argumento da crise financeira internacional, o Governo Federal e os Governos dos Estados de Minas Gerais e São Paulo injetaram nos bancos e nas montadoras de automóveis, cada um, R$ 4 bilhões de reais, enquanto isso cortam e reduzem o orçamento do INCRA para o ano que vem, que aqui no Estado conta com apenas cinco funcionários para atender toda a demanda quilombola.
A mais recente afronta que tivemos notícia são as negociações que estão sendo feitas na SEPPIR com a bancada ruralista para a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial sem o capítulo quilombola, demonstrando que os projetos anunciados para o povo quilombola não passam de maquiagem para tentar esconder a cara feia das intenções do governo.
No estado reflexo dessa situação podemos observar, que apesar dos esforços da Federação das Associações das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio Grande do Sul, pautando o parlamento estadual para criação da Frente Parlamentar, articulando as comunidades para a luta, o Governo do Estado tem se mantido inerte na atenção à demanda quilombola e ignora a Lei 11731/01. Podemos citar como exemplo do quadro de inoperância a situação da comunidade de Casca, protagonista dessa luta no Estado, situação que se arrasta há 10 anos; Morro Alto com todo seu protagonismo de lutas que vê a área do quilombo ser rasgada pela BR 101 e desrespeitada pelo DNIT. Podemos falar da Comunidade de Mormaça, em Sertão, e os conflitos sofridos pela mesma. Na Capital, atualmente, estamos em quatro quilombos, sendo que ainda este ano tivemos que nos mobilizar pelo fato de que a Prefeitura queria abrir a rua João Caetano, rasgando o Quilombo da Família Silva ao meio, em total desrespeito aos interesses daquela comunidade, destruindo nascentes e a vegetação secular da área. Temos o caso da Chácara das Rosas, em Canoas, que em decorrência da ausência de questionamento já poderia estar titulada.
De conjunto, para o Estado exigimos transparência e respeito às prioridades quilombolas, no que se refere ao repasse de recursos para a sustentabilidade das comunidades, bem como no marco da Convenção 169 da OIT sejam ouvidas e respeitadas as comunidades quilombolas no que se refere as medidas administrativas e legais que gerem impacto sobre as mesmas.

NESSE SENTIDO CONVOCAMOS A TODOS E TODAS PARA:

Referendar a denúncia feita por entidades e comunidades quilombolas do Estado Brasileiro à OIT, por descumprimento da Convenção 169.

Repudiar os métodos de construção da Instrução Normativa 49 do INCRA/Governo Federal, que feriu os preceitos determinados pela convenção 169 da OIT, em especial o da boa fé, retardam e burocratizam os já lentos procedimentos para demarcação e titulação, afrontam princípios presentes no Decreto 4887/2003 e do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, nesse sentido referendada também a comunicação à OIT.

Observamos que a convenção 169 da OIT determina no seu art. 6º(2) que: “a consulta deverá ser efetuada com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas”. Tal dispositivo não foi respeitado.

Requerer que o Ministério Público Federal abra investigação contra a União Federal, AGU e o grupo de trabalho que implementou a modificação da IN-20 e criou a IN-49, de 2008, por afronta à Convenção 169 da OIT e uso de má fé na referida consulta, bem como para sustar os efeitos da mesma e a construção de uma consulta real nos moldes previstos na Convenção 169 da OIT, que permita a participação efetiva dos quilombolas em todo o país, considerando as peculiaridades e especificidades das comunidades.

Apontar para a construção de uma jornada de luta nacional contra a retirada de direitos e exigindo o imediato arquivamento do PDC 44/2007 (Deputado Valdir Colatto – PMDB-SC) e arquivamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade, exigindo o indeferimento da mesma pelo Supremo Tribunal Federal.

Apontamos para a construção de um Encontro Nacional Quilombola, com o movimento social negro, precedido de encontros nos Estados e articulado com os movimentos sociais em geral, especialmente com os povos indígenas, comunidades tradicionais e movimento sindical e de luta por terra e moradia, para pautarmos perante a sociedade e Estado Brasileiro nossas demandas.

Exigir a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, com fundo de reparação e com manutenção do capítulo quilombola, repudiando e desautorizando qualquer manobra em sentido contrário.

Pela aplicabilidade da Convenção 169 da OIT para as comunidades quilombolas.

Por uma proposta orçamentária e política de estado compatível com a demanda quilombola, com prioridade para a titulação e sustentabilidade das mesmas.


PELA TITULAÇÃO IMEDIATA E SUSTENTABILIDADE DAS TERRAS QUILOMBOLAS!
FACQRS Quilombola" <http://br.mc657.mail.yahoo.com/mc/compose?to=facqrsfederacao@ibest.com.br

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