domingo, 14 de junho de 2009

Iggy Pop, Green Day e esse tal de rock

Há algum tempo não escrevo por aqui sobre música. E que me lembre raramente escrevi sobre rock. Tal lacuna talvez se explique pelo fato de que há alguns anos não consigo gostar de nada que se define, ou é definido como rock. Sim, lógico, existem algumas raras exceções que, no geral, confirmam a regra. Mas a afirmação abaixo de Iggy Pop me instigou demais. Instigou porque em linhas gerais concordo com tudo que o Velho e Bom Iggy disse a uma revista freancesa:
“... fascina-me a eternidade dos clássicos. E, além disso, sempre gostei estar do lado dos outsiders. E nesse momento, que possibilidades tem um standard frente a um novo disco do U2 ou do Coldplay? O rock se tornou a pior forma musical da atualidade: a mais feia esteticamente, a mais corrompida, a mais cínica e a que acompanha os piores sentimentos!"

Chamo a atenção para a parte que grifei em negrito. Concordo com Iggy: o rock atual é a pior forma de corrupção musical, algo que esteticamente enjoa e cinicamente canalha para ser fruído com algum prazer...

Dito isso, vamos a uma das exceções. E uma bela exceção: Green Day. Sim a banda californiana, que nasceu pop-punk... aquela mesma que se orgulhava de nada representar, de não se posicionar politicamente...surpreendeu no ano de 2004, com uma punk-ópera: American Idiot. Pois bem, cinco anos após o lançamento e muitos elógios, o aclamado disco de 2004 agora foi adaptado e será um musical da Brodeway (engraçado, agora me dou conta que não sei escrever a palavra Broadway).

Assim se referiu ao disco o crítico Wladimyr Cruz, no longínquo ano de 2004:
"Ufa! Enfim, o disco realmente parece uma trilha sonora de algum filme/peça de teatro que nunca existiu, e se você for acompanhando as letras, verá como tudo é bem amarrado e forma realmente um disco conceitual. O Green Day passou dos limites, chegou ao ápice de sua criatividade, cara-de-pau e loucura musical, e o triste disso tudo é que provavelmente todo esse conteúdo não será assimilado pelos fãs da banda, que dirá pela massa. Tudo cabeça demais para a molecada engolir. É como se "American Idiot" fosse o "Load" do Metallica. Meu veredito? Porra, é Green Day, a maior banda punk dos anos 90, e talvez a maior promessa do rock no novo milênio."

Pois bem depois do American Idiot, no pós idiot-leader Bush o Green Day, volta à carga e cinco anos depois surge: “21st Century Breakdown”. “21st Century Breakdown” é, de certa forma, uma seqüência do bem-sucedido “American Idiot”. Uma ópera rock focada na história de dois personagens, Christian e Gloria, sendo o primeiro alguém extremamente auto-destrutivo, revoltado e o segundo, uma mulher cheia de ideais e esperanças.
Em entrevista a MTV norte-americana, que pode por um feliz acaso, acompanhar em uma destas madrugadas o grupo explicou que este trabalho é uma mistura de influências e por isso experimental: por exemplo, o trio montou no estúdio de gravação um quadro com uma grande gráfico em forma de pizza: cada fatia representava estilos musicais diferentes e de agrado do grupo. Indo desde o rockabilly passando pelo death metal, p.ex.. A idéia era combinar acordes dessas diferenças influências e com isso, acredito (já que não foi dito nesta entrevista) produzir um colapso digno do século XXI. A banda divide o álbum em 3 atos – Heroes and cons, Charlatans and Saints e Horseshoes and handgranades – num total de 18 faixas.

Em que a banda na faixa ‘Know your enemy’, do primeiro ato clama por uma revolução que combata o silêncio. Nada mais adequado nessa época de silêncios atordoantes e de barulhos desacossadores. O segundo ato se inicia com o petardo ‘East Jesus nowhere’ que toca em temas como o recrutamento para o genocídio, Deus e religião, sempre com peso. O disco segue com ‘Peacemaker’, citando a paz apenas com vingança. ‘Last of the american girls’ é pop e trata do desastre das garotas americanas. A faixa seguinte, ‘Murder city’, é gás puro e fala do desespero e falta de esperança. Na seqüência, falando de abandono e da vida nas ruas, é a vez de ‘¿Viva La Gloria? (Little Girl)’. Mais uma balada, agora com ‘Restless heart syndrome’, exclamando que você é seu maior inimigo, vítima do sistema, encerrando o segundo ato. Para finalizar como qualquer Manifesto o disco traz no terceiro ato e na última faixa ‘See the light’, um apelo a luta: saber de que vale a luta, pois no fim é possível ver a luz no fim do túnel.

Escute seis canções de "21st CB" no site oficial do grupo (greenday.com): BreakdownBefore, The Lobotomy, East Jesus Nowhere, Restless Heart Syndrome21, Guns, American Eulogy. Ou então http://www.21stcenturybreakdown.com.br/
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Para finalizar, a resenha da Rolling Stone do disco:

Como suceder ‘American Idiot’: Com um épico ainda maior e de três Atos.Green Day – 21st Century Breakdown ()Por Rob SheffieldDesde que o Green Day eram os moleques do punk dos anos 90 que ninguém esperava que fossem crescer, tudo o que eles fazem vira uma surpresa. E o que é mais bizarro: o fato de que eles soam tão ambiciosos e audaciosos em seu oitavo álbum ou o fato de eles terem é conseguido chegar no oitavo álbum? De qualquer maneira, os perdedores que detonaram nas rádios em 1994 gritando “I got no motivation,” com Billie Joe Armstrong largado no sofá da sua mãe – eles acabaram sendo os últimos a ficarem de pé, aqueles vivendo ainda pelos ideais de sua época e escrevendo as canções mais difíceis de sua carreira bem depois de terem passado o ponto de acabarem no programa de TV Sober House (programa da VH1 onde estrelas famosas entram para reabilitação). E eles o fizeram com uma maldita ópera-rock.American Idiot parecia ser o kamikaze da carreira da banda – um álbum conceitual sobre esperanças e sonhos americanos, com personagens chamados St. Jimmy e Jesus of Suburbia? Bela tentativa! Mas, o álbum não somente resgatou o Green Day do limbo onde se encontravam, mas recarregou as baterias musicais da banda. Com quase 6 milhões de cópias vendidas e ainda contando (*só nos EUA), American Idiot se tornou a espécie de blockbuster multi-platinado do rock que não deveria mais existir, pois o Green Day se transformou naquela banda que não tem mais como existir outra igual – lidando com paixões fulminantes, correndo o risco de darem com os burros n’água com tal argumento. Até mesmo as canções que não funcionaram ou as partes do roteiro que não faziam sentido apenas aumentavam a diversão, pois Armstrong, o baixista Mike Dirnt e o baterista Tre Cool se recusavam a diminuir o ritmo.21st Century Breakdown é ainda melhor, tão majestoso e confiante que faz com que American Idiot pareça apenas uma espécie de “aquecimento”. Estão de volta no modo ópera-rock, dividindo o álbum em três partes, “Heroes & Cons,” “Charlatans & Saints,” e “Horseshoes & Hand Grenades.” Mas, desta vez não existem viagens de cerca de nove minutos – apenas duas das 18 faixas do álbum chegam na marca de cinco minutos – e o Green Day focou suas idéias em suas canções mais difíceis e afiadas até hoje. Armstrong traz agora uma compaixão ainda maior em seu vocal, até mesmo quando cospe versos auto-dilacerantes como, “My generation is zero/I never made it as a working-class hero.”Assim como American Idiot, 21st Century Breakdown é um épico com um pé nos anos 70, contando a história de dois jovens amantes punks em meio à fuga no colapso da América pós-Bush. Os heróis aqui são Christian e Gloria, dois garotos alienados pela igreja (“East Jesus Nowhere”), pelo estado (“21 Guns”) e por todos os adultos nos quais um dia eles acreditaram (“We are the desperate in the decline/Raised by the bastards of 1969”). Christian é o auto-destrutivo impulsivo (“Christian’s Inferno”), enquanto Gloria é mais idealista e política (“Last of the American Girls”), mas são forçados a cuidarem um do outro, pois ninguém mais fará isso por eles.Ao longo do álbum, a banda combina a força do punk com seu mais novo amor pela grandiosidade do rock clássico – em um momento estão falando de Bikini Kill, no outro estão mandando brasa no que parece o minuto final de “Jungleland.” A faixa-título é uma canção com diferentes partes que paga um tributo descarado à hinos de rádios dos anos 70 como “Bohemian Rhapsody” do Queen, “Fox on the Run” do Sweet e “All the Young Dudes” do Mott the Hoople. Armstrong nos leva para um tour do país, desde sua infância difícil (“Born into Nixon, I was raised in hell / A welfare child where the teamsters dwelled”) à idade moderna (“Video games to the towers’ fall / Homeland Security could kill us all”). Ele acaba com nada mais para mostrar a não ser sua raiva e o coração para transformar esta raiva em canções.As baladas são as mais açucaradas até hoje; “Last Night on Earth” poderia ser da banda Air Supply e não pense por um minuto que eles não adoram a idéia de irritar as pessoas com isso. Mas, os destaques são os hinos punk cheios de raiva. Eles se levam por entre violões latinos (“Peacemaker”), coros à la Clash (“Know Your Enemy”) e ataques de quatro acordes como na época de garagem (“Horseshoes and Hand Grenades”). “Last of the American Girls” aparece como uma canção de amor descompromissada para uma garota rebelde – quando Armstrong canta, “She won’t cooperate,” ele a está elogiando da melhor maneira possível.O Green Day desta vez mira sua arma na religião, com “East Jesus Nowhere” enquanto atacam a hipocrisia Cristã. Mas, na maioria das vezes cantam sobre o fato da América agora acordar de um pesadelo que durou oito anos. Na balada “21 Guns,” eles ainda parecem ter uma palavra ou outra para os desiludidos apoiadores de Bush (“Your faith walks on broken glass / And the hangover doesn’t pass”).Parte da emoção de 21st Century Breakdown é que os caras do Green Day não precisam se esforçar tanto assim. Não é que não existe ninguém mais com quem eles possam competir. (O quê? Sponge vai gravar uma adaptação tripla de Moby Dick? Provavelmente não!) Ainda assim, o esforço extras é ouvido na música e cada canção adiciona algo à vibe total de homens maduros tentando dificilmente se comunicar, desafiando-os juntamente com sua audiência. Eles revitalizam a idéia de verdadeiros rock stars que têm algo a dizer para o mundo real. Estão mantendo promessas que eles mesmos nunca fizeram, promessas deixadas para trás por todas aquelas bandas medianas dos anos 90 que acabaram pelo meio do caminho. Se é uma surpresa contínua o fato da banda ser os únicos a sempre pegarem a tocha e seguirem em frente, isso é parte do que faz 21st Century Breakdown tão atual e vital – O Green Day soa como se estivesse chocado como qualquer outra pessoa.

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